segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Luas e Estrelas

Havia uns 5 anos desde a última vez que o encontrei. Costumava encenar algumas peças escritas por ele quando éramos mais íntimos, antes do seu último casamento. A mulher havia deixado apenas uma pequena quitinete onde agora nos encontrávamos. Um café morno fazia esforço pra esquentar minhas mãos, enquanto lutava comigo mesmo para ser mais cordial com meu velho amigo.
"É uma metáfora!" - Nem precisava me dizer, sempre era uma metáfora.
"Mas é sobre o que exatamente?" - perguntei meio entendiado.
"É sobre relacionamentos. A história fala de luas e estrelas. É mais um esboço de uma ideia antiga, sobre narrativas estarem escritas no céu, apenas esperando a nossa leitura tímida." - Era bom vê-lo falar de romantismo depois do acontecido.
Como não falei mais nada, continuou.
"Podemos comparar os relacionamentos humanos apenas olhando pras estrelas e luas."
"Como assim?" - indaguei, querendo mostrar interesse, apesar do café ser mais digno de minha atenção.
 "A estrela tem luz própria. A lua não. Ela apenas reflete a luz da estrela, certo? É como nós! Olhe a sua volta: existem aqueles que vivem em função do outro, depende do amor dele e só reflete aquilo de volta. Ele não ama por si só, apenas copia, mas não percebe. Quando descobre suas próprias intenções, ou quando se decepciona, a cópia do amor morre - não tem luz própria.
"Certo, mas então, como amar do jeito certo? Nós só temos um sol e uma lua, um sempre terá que ser a fonte de luz do outro."
"Quem disse? Você está pensando só no nosso sistema! E não me impressiona sempre pensarmos NESSE sistema. Existem estrelas gêmeas, onde as duas vivem em harmonia em um único sistema. As duas têm luz própria e ambas são afetadas pela gravidade gerada pela outra."
"Mas essa metáfora não é novidade! A ideia de alma gêmea é uma das mais velhas que existem!"
"Pode ser, mas o que seria alma gêmea? Duas pessoas que nasceram uma pra outra? Não é disso que to falando. Falo de almas que têm luz própria e se deixam afetar pelo centro gravitacional de outra. ISSO é o que, em termos de alma, chamamos de gêmeo."

Parei de discutir. Não havia o que falar. Depois do que passou, estar tão obstinado com tal ideia poderia significar a salvação de sua alma, que após a supernova do seu coração, formou um buraco negro com o que restou de seu núcleo.

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

O Forte e o fraco

O Forte gabava-se do fraco
O fraco não temia o Forte

O Forte de tudo provava
E nunca morria

O fraco em tudo morria
E sempre vivia

O Forte era amado por todos
O fraco, rejeitado

O Forte comia carne
O fraco, legumes e cereais

O Forte não sabia quem era
O fraco via-se no espelho todos os dias

O Forte se matou
E o fraco...


 
Bem, o fraco foi o que restou.




Um conto sobre fé.

domingo, 11 de agosto de 2013

Alquimia, Universo e Salvação

"Não existe almoço grátis!" - Começa meu professor de bioquímica em sua aula sobre Termodinâmica. Tudo tem seu preço. Desde o seu almoço até uma "simples" reação química. Tudo depende e gasta Energia. Esse é o preço cobrado pelo Universo.
Os alquimistas já sabiam disso na idade média. Com sua já rebuscada filosofia, conceberam uma ideia, mais especificamente na forma de um objeto, que seria capaz de contornar o preço cobrado para se realizar qualquer coisa. Deram um nome a essa ideia/objeto: Pedra Filosofal.
A pedra filosofal não é uma busca apenas dos alquimistas. É a busca da humanidade. Essa raça, estranha, capaz de pensar além do que se vê. Capaz de construir e destruir o mundo. Capaz, sempre um potencial, sempre um possível. E é exatamente por isso, que conseguimos pensar em algo que saia do sistema monetário do universo. "Porque é possível" - grita a nossa alma desde o início dos tempos.
Tudo sempre girou nessa questão fundamental: Como vencer o Universo?
O marketing parece que aprendeu a lição. O que mais querem os humanos, senão aquilo que é de graça?
"De graça até injeção na testa!" - já dizia meu tio-avô sem saber que por trás dessa simples frase se residia um dos mistérios da vida. E é disso que escrevo. Daquilo que é de graça: A própria Graça! Encarnada num riso de uma criança que, simplesmente, achou graça do palhaço ou estampado no olhar de um pai que recebe um presente de seu filho.
De fato, só existe uma única coisa que é realmente de Graça nesse universo: a Salvação. Que outra coisa seria? Senão aquilo que nos livra de ter que pagar a fiança?
A única coisa que nos salva de ter que pagar a lei máxima do universo, da física, da termodinâmica, que foge a lei da ação-reação, que não obedece gravidade, que é a pedra filosofal, que é a busca eterna do homem é justamente de graça. E que outra palavra pra descrevê-la, senão Graça?



Já dizia The Cranberries: Salvation is Free!

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Casmurro

Bento,
São bento,
Sou  Bento.

Tu, livro,
Capítulos,
Capitú.

Capita-me!
A dá-lhe que sou teu
Dom




Casmurro.

quinta-feira, 1 de agosto de 2013

Por ora

Só por ora,
Sou livro.

Quão quase a toda hora
Sou homem.

Mas só por agora
Sou livro.

E somente nessa hora
Falo do homem.

Sou livro, embora
O homem seja livre,

E lembra do que fora outrora.

Sou livro porque jaz no túmulo
O homem que foi embora.

Machado, vermes e livros.

Aprendo com Machado e seu Casmurro que todo livro está fadado ao fracasso. Toda letra será comida por vermes, e estes, não sabendo o que comem, roem toda a esperança do escritor. Ao perguntar para o verme se sabes algo do que comes, teremos a mesma resposta: de nada sabemos, só roemos. Quem são os vermes? Acaso são apenas os minúsculos seres que nascem da terra? Oh não! Não apenas! Somos também vermes, leitor. Ao passo que roemos as palavras daquele que escreve, estamos destinados a reduzir ao pó tudo aquilo que um dia foi definido por uma pena. Sim! Somos os vermes que dilaceram a esperança dos que acreditam em sua obra! A letra mata, sim! Mas ela também morre! Nós a matamos!