terça-feira, 24 de março de 2015

Amar o elo

Uma experimentação teatral


É rio
É mar
Ah,
O mar...
Maré
A maré
Amar é
Ser rio
Sério!
Se rio
É por amar
O mar

........................

Das águas à forma
Da forma ao gesto
Humilde
Que transcende a fôrma
E volta a ser água
Fluido
Qualquer coisa
De todas as formas

.........................

Corpo-peixe
Que se funde ao mar
Por amar o que é e o que pode vir a ser
Peixe-sol
Peixe sou
Amarelo

segunda-feira, 2 de março de 2015

Solitude

E do alto da montanha
Bem no meio da mata
Em solitude ingrata
O velho sábio proferiu:
A ironia também mata!

Paixão-política

O calor do momento vem sempre acompanhado de fumaças que obscurecem a visão sobre os acontecimentos. Do que passo agora, não posso afirmar nem tirar conclusões satisfatoriamente sensatas. Há de se esperar passar. À frente, quem sabe, não poderemos olhar para trás e ver o que realmente estava acontecendo? Política se faz no passado e no futuro. A do presente é sempre mascarada pelas paixões.

Prece ao Sol

Se por favor
Ou piedade
Misericórdia

Da maldade
Que por outrora
Fizemos rota
Contra o bem
Que ao lado brota
E queimamos
A bronca torta
O verde que desbota
E vira o cinza
De vida morta

Perdão
Grande sol
Humildemente te peço
Até quando fustigarás
Nossa cobiça fugaz
Preguiça tanto faz
De preservar-lhe o poder manso
De não nos responder em avanço
Quando respiras o incenso
Da mata virgem em sacrifício
Quando ali no cantinho
Queimávamos nosso lixo
Por conveniência
Mero capricho

Não levais em consideração
Os muitos que por ignorância do coração
Ensurdecem a razão
Desprezando a bela missão
De sediar a consciência da criação!

Apelo Universal

Cria-se e destrói-se no amor; paralisa-se no temor. No magnetismo vigente da natureza Bem e mal se confundem, e o homem, em sua ingrata torpeza se esquece que à Deus nada deve. Sou apenas mais um ponto que o Universo escolheu pra perceber a Si próprio. Um grão de areia, munido de um espelho pro mundo, sou manifestação temporária do Espírito Uno.
Tudo é um enorme gradiente de energias sutis. Tudo e Nada. Paradoxo inexorável do pensamento projetado pra fora do labirinto neural.
Todo sim pressupõe um não, e na luta: "cérebro x coração" não há vencedor. O empate é garantido pela eterna lei do semeador.
Que dirá o homem de si mesmo? Se é do ego que provém o discurso!
Não haveria eu de desconfiar de mim? Pois, se é assim, quem há de julgar o que penso, o que falo, o que faço ou o que calo?
Condenação é melhor deixar pra lá, é mais saudável abster-se de querer governar coisa alguma. Destino e acaso são dois irmãos que nasceram colados. Nós, brincando de deuses, separamos, à brusca maneira dos insensíveis, aquilo que sempre foi um. Há de se juntar! Há de se criar um novo mundo! Há um novo mal a se perdoar a cada segundo!
Que o medo não nos faça desistir. Que o amor nos faça resistir.
Que a bela e terrível ironia da vida continue a nos fazer rir!
Até o fim.
E um novo começo.
Preconceito é aquela coisa inventada pra fazer você desconfiar de si mesmo.

Dos benefícios do esquecimento

Ah, se tu soubesses o que passa nas imemoriosas cicatrizes que guardas dentro do peito! Mas não! A ineficaz capacidade humana de esquecer da própria dor se encarrega de cegar-lhe os olhos do passado!
Vê? Já não se lembras mais!
Qual muro chapiscado foste responsável por arranhar-te os sentimentos?
De que ferida a casca seca e se desprende, a fim de ser decomposta em bactérias supérfluas?
Esquecestes...
E como os ventos, que vão e vêm, e trazem nova brisa, ainda que da mesma origem, continuas a percorrer o labirinto do coração! A cada armadilha, a vaga sensação de já ter passado por ali...
Ah, memória! Por que faltas aos teus senhores quando precisam de ti? Por certo não se abstêm quando lhe convém?
Felizes daqueles que se esquecem, ainda que, doravante, passem pelos mesmos percalços!
É melhor esquecer e reviver, do que lembrar e remoer!

Do perdão

Criticava tudo. Verborragicamente intolerante as massas. Massa pra amassar, triturar, cozer... 
Farinhada vinda de um mesmo saco. Tossia ironia e ao pó liquefazia as verdades universais de que tudo morre.
Percebeu, até então, diásporas de todos os cantos da Terra: dispersavam-se mutuamente em guerras inconclusivas.
De nada adiantava o suicídio - voltaria ao pó como cinzas recorrentes que caem de um incêndio florestal. 
Se morria, era pra denunciar o óbvio (que ironicamente já se fazia desde sempre em seu mundo).
Mártires de uma causa perdida.
Ao se encontrar com seu desespero, viu o quão inútil era sua sina. 
Se criticava, era por ver no objeto de sua crítica seu pŕoprio pecado não confessado.
Fez-se sacrílego pelo perdão que nunca alcançou por suas próprias mãos.
Se era pra ser redimido, precisava antes de mais nada, redimir.
Tudo o que se diz, no fundo se é.
Tudo o que desliza em superfície revela, no mínimo, sua distância até o centro gravitacional da alma que flutua num eixo em suspensão virtual.
Encontraria a paz no momento em que conseguisse perdoar seu maior demônio: Ele mesmo.

Olhos atentos

Olhe para o mundo ao seu redor. Vês? Teus sonhos já não parecem tão absurdos assim! Se, por certo, a realidade surpreende em cada esquina do labirinto, quem há de negar as probabilidades ensaiadas nas dimensões oníricas? Visto que tudo não parece passar apenas de percepções resultantes daquilo que se vê e daquilo que falamos pra nós mesmos que vemos?

Sentimento de dentro da fumaça dos acontecimentos

Paixão que obscurece a capacidade humana de simular futuros.
Paixão que compra ódio e levanta bandeiras manchadas com o sangue alheio.
Paixão que transforma opinião em verdade a ser defendida.
Paixão que desfaz amizade de infância.
Paixão que mata.
Paixão que desmata.
Paixão que engessa, paralisa e cativa.
Paixão, irônica, independente de lado: nasce e morre no sujeito apaixonado.



Paixão-política.

O cômico irônico

O cômico do dicotômico é querer ser dois a nível atômico.

O desejo, ora chamado de querer, e sua dança cósmica com a vontade

O querer é confundido com a vontade. Me parece que a vontade é aquilo que vem de dentro, o querer do meio termo. Não posso dizer de fora de onde, por certo, vem a influência, mas da fronteira, da fina ligação entre o interior e o exterior. O querer é aparente, e passa rápido como uma faísca de vontade. O perigo mora na insistência em confundir os dois. Não satisfazer um querer não mata a vontade, que continuará latente em algum lugar. Não satisfazer a vontade, ou melhor, não procurar modos de a fazer valer, parece matar aos poucos aquela fé interior. Ambos coexistem, é simbiótico. Um quer do agora, o outro deseja do eterno. Somos esse elástico, que ora contrai para o presente, ora se estica para abraçar o futuro. Não se pode querer amarrar a vida sem a capacidade de se esticar. Há de se tornar flexível, ou engessar-se e fazer valer de nós para conter a alma. Remendos em um elástico que já não se estica. A alma é fluida, se adapta. O corpo é seu método. Querer e vontade se abraçam em harmonia, ou brigam até que o elástico se rompa.