Três árvores. Apenas três é o que minha vista alcança. Felizmente meu cérebro é um amigo fiel: transforma a realidade em fantasiosa miragem que me acalenta com uma floresta exuberante. A uma semana que penso na minha vida, afinal, não tenho mais o que fazer. O tédio é meu parceiro intermitente e faz companhia ao meu desespero, encorajando-o. Nesse meio tempo, encontrei o sentido da vida - da minha vida - apenas não posso expressá-lo em palavras, e temo que em breve o esquecerei (pro meu azar, ou sorte, sei lá). Vi a babilônia, vi o inferno, vi a noiva, vi o universo, vi o Aleph, vi Adão, vi Raul à 10.000 anos atrás... Vi, e não vi. Vivi. Conheci. Assim mesmo, no passado, pois o presente é essa projeção para o futuro no eterno retorno ao passado.
É verdade, estou em coma, já era de se desconfiar. Que importa? Não vivo, só por não poder me comunicar com o seu mundo? Fui atropelado. Só lembro de ver o carro, de luxo por sinal, vindo na direção da minha moto. Eu estava entregando pizza, o motorista, saindo da igreja. Eu não tenho família, sabe? Nem sei se alguém deu por minha falta, estou num leito do SUS.
Creio que não sairei deste estado para a vida material. Felizmente, eu vi o mundo. Eu vi Deus. Foi um mergulho profundo, infinito dentro de mim mesmo, mas Ele estava lá! Foi aí que vivi. Pergunto de novo: não vivo, só por não poder me comunicar com seu mundo? Se eu acordar, esquecerei de tudo, não quero, a mente é traiçoeira...
No meu desespero, eu encontrei a esperança. Na minha morte, encontrei a vida. Por um breve momento, abri os olhos, vi três árvores - era a única coisa visível da janelinha do quarto de hospital. Logo depois, fechei-os, e nunca mais abri.
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